Apresentaremos o texto de
memórias literárias “Sinais do tempo, marcas de saudade” selecionado pela Comissão Julgadora de
Criciúma para participar da etapa estadual da 4ªedição da Olimpíada de Língua
Portuguesa Escrevendo o Futuro.
O texto de memórias foi
escrito pela aluna Camille Mezzari Generoso, sob orientação da professora
Eliane Tezza Bortolotto, da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Padre José Francisco Bertero.
Sinais do tempo, marcas de saudade
Parece que
foi ontem que ainda menina ia à escola com meus irmãos, sentindo as pedras da
estrada machucarem meus pés, pois as sandálias de dedos já estavam gastas.
O caminho
era longo, cheio de árvores, pássaros, plantações de milho e cana-de-açúcar.
Bom, pelo menos a paisagem que enchia de verde nossos olhos e a orquestra que
brindava de graça nossos ouvidos compensava o cansaço e a dureza da caminhada.
Minha
professora era rígida e ainda posso sentir a lembrança da régua a me bater, sem
grande motivo. Na volta pra casa, pegava uma cana-de-açúcar para aliviar a
fome. O doce sabor da cana me traz água na boca. Gosto de infância!
Tenho
saudade das brincadeiras com meus irmãos, da algazarra nas refeições, da
alegria nas festas em família e das noites de lua cheia quando nossa folia
irritava os vagalumes, que riscavam o céu com suas pequenas lanternas. Nas
laranjeiras fazíamos competições: quem chegasse ao topo mais rápido, ganhava. O
prêmio ao vencedor? Ser o vencedor! Lá no alto podíamos admirar os ninhos dos
passarinhos, conversar coisas de irmãos, falar sobre nossas dúvidas e medos,
contar segredos e até algumas mentiras, que de tão inocentes nem era pecado
contar. Nos sábados à tarde, com o sol faiscando, íamos brincar num riozinho de
águas limpas, sem poluição, onde os peixes nadavam tranquilos e ainda tomavam
parte nas brincadeiras, pois beliscavam nossas pernas, dividindo gentilmente
conosco um espaço que era deles. Quanta alegria!
Ajudar minha
mãe era meu serviço, já que minhas irmãs eram pequenas e meus irmãos iam com
meu pai para a roça. O trabalho era cansativo e às vezes minhas mãos de menina
reclamavam tantas tarefas diárias. As mesmas águas do rio nem sempre serviam à
diversão, pois era ali que lavava roupa todos os dias.
Quando o sol
pintava de fogo o horizonte, era hora de voltar para casa e como não tínhamos
luz elétrica, as noites eram longas e misteriosas, cheias de ruídos de sapos,
grilos e outras criaturas da noite. Ao amanhecer, ouvíamos o canto dos
passarinhos e do galo anunciando um novo dia.
Mas essa
natureza que preenche meu álbum de recordações com tão belas gravuras, também
me traz lembranças trágicas, como as tempestades e seus raios, que como flechas
impiedosas faziam suas vítimas. Perdi um irmão e um primo atingidos por raios,
o que era comum naquele tempo onde havia poucas casas e grandes áreas
desabitadas. As enchentes também eram devastadoras e a pior foi a de 1974. Foi
em cima da armação da casa sem forro que colocamos o que de mais valor tínhamos
com medo de que as águas invadissem tudo. Dias e noites de vigília. A tristeza
abalava a todos, pois perdemos desde plantações até animais, que eram os mais
afetados, pois não havia abrigo para todos. A força das chuvas fazia nossa velha
casa de madeira balançar, deixando a todos amedrontados.
Quando a
chuva parou e a água abaixou, o cenário a nossa frente tinha muito pouco
daquele que nossos olhos conheciam de cor, mas não era hora de fraquejar e sim
de recomeçar. E foi o que fizemos.
Nos domingos
íamos todos à igreja. Isso era sagrado para meus pais, assim como a reza diária
do terço. Era na fé que encontrávamos forças para lutar, mesmo depois de tantas
perdas.
O tempo
passou e o interior de Jacinto Machado não oferecia muitas oportunidades de
trabalho. Mudei-me para Criciúma depois do Ensino Médio completo e com meus 33
anos na mala. Morar na Capital do Carvão era um desafio e a adaptação há 18
anos não foi tão fácil assim. Foi um choque para os meus olhos acostumados com
tanto verde, com a calma e o silêncio viver num lugar onde tudo anda tão
rápido. Pessoas sempre apressadas, muitos carros, prédios, barulho e cheiro de
progresso.
Mas aqui era
agora meu novo lugar, onde construiria a minha família, o lugar do meu futuro,
da continuação da minha história, lugar que me recebeu de braços abertos e me
presenteou com tantas coisas boas! E foi
esse o pedaço de chão que escolhi para viver outros sonhos.
No baú das
recordações passadas ficou minha terra natal e, vez ou outra a saudade vem me
visitar, mas olhando o hoje e o horizonte do futuro é aqui em Criciúma que eu
me vejo e em nenhum outro lugar.
Parabéns Camille!
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